quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Por que não apostar nos créditos de carbono: As megalomanias em torno da solução climática

Michael F. Schmidlehner
Você já ouviu  falar de “REDD”? A sigla significa “redução de emissões por desmatamento e degradação florestal”. Trata-se de um mecanismo financeiro que visa a mitigação do aquecimento global através da  fixação de gás carbônico, cuja emissão é considerada uma das principais causas do efeito estufa.  O REDD foi concebido pelos governos das Nações Unidas no âmbito da Convenção Quadro para Mudanças no Clima e baseia-se no comércio de créditos de carbono.
De forma concreta, um negócio de carbono poderia funcionar por exemplo assim: Uma comunidade local amazônica se compromete a não desmatar ou degradar a floresta durante os próximos – digamos cinquenta – anos e desta forma garante que o gás carbônico que esta contido na biomassa das árvores continue nelas fixado e não esteja liberado na atmosfera.
Este comprometimento, através de uma agência de certificação, é transformado em um certificado. Este certificado por sua vez é adquirido por uma indústria que emite gás carbônico acima das normas estabelecidas em seu país e, em compensação, procure contribuir com a fixação de gás carbono em outro lugar. A industria paga pelo certificado, se torna “neutra em carbono” e a comunidade recebe pagamento durante o período estabelecido.
Atualmente, o negócio com os créditos de carbono é por muitos considerado a grande oportunidade para contornar a crise climática e ambiental e ainda beneficiar os povos da floresta.
O Estado do Acre preenche um papel “pioneiro” na consolidação deste novo modelo de economia supostamente sustentável. Visando a inserção do Acre no mercado
internacional  de carbono, o governo criou uma lei especifica de pagamento por serviços ambientais e vem articulando um acordo multilateral de comercio de créditos de carbono com a Califórnia (EUA) e o Estado mexicano de Chiapas.
Neste artigo, assim como em outros que pretendo publicar nesta coluna, eu quero mostrar que o caminho dos créditos de carbono é errado. As considerações e os exemplos que pretendo expor contra o REDD  se enquadrarão em três argumentos principais: Primeiro, seus impactos negativos estão sendo negligenciados. Segundo, os benefícios para as comunidades são duvidosos. Terceiro, a filosofia por trás dos créditos de carbono é fundamentalmente insustentável.
Começando pela questão da sustentabilidade, temos que constatar que a ideia essencial do REDD não é de salvar ecossistemas ou preservar florestas. Inseridos na lógica do comercio de carbono, a importância dos mesmos se reduz à sua função como fixadores de carbono. Suscita a pergunta: E se alguém inventa um outro meio mais eficiente de providenciar esta fixação?
Na medida em que o comercio de carbono vem se tornando uma nova corrida pelo ouro, megaprojetos de fixação de carbono surgem. As novas tecnologias que se propõe são chamadas de “geoengenharia”. Trata-se de planos megalomânicos e extremamente perigosos de intervenção em larga escala nos ecossistemas e na atmosfera do nosso planeta.
Uma das propostas mais discutidas atualmente é de super fertilizar os oceanos, causando a criação de grandes quantidades de algas que devem capturar o gás carbônico e – ao morrer – arrastá-lo para o fundo do mar. Testes desta tecnologia foram conduzidos nos últimos anos no oceano Antárctico e nas Filipinas, sob os protestos de  pequenos pescadores e ambientalistas que temem pela biodiversidade marítima e pelo sustento das comunidades.
Voltando à pergunta: Se a fixação do carbono pode ser providenciada através de um projeto de geoengenharia deste tipo, o que aconteceria? Além de provavelmente acabar com grande parte da biodiversidade marítima, destruir a base de vida das comunidades pesqueiras afetadas e ameaçar o equilíbrio de diversos ecossistemas,  algumas pessoas se tornariam muito ricas e o mercado de créditos de carbono seria de uma vez inundado com milhões de créditos, causando a queda do valor dos mesmos nas bolsas.

E a  preservação de florestas como forma de fixar gás carbônico? Ela ainda seria “rentável” nesta situação de mercado?
O REDD – baseado no pagamento pela fixação de carbono e atrelado nas altas e baixas das bolsas de valores – é fundamentalmente insustentável. Não é por acaso que as empresas petrolíferas investem fortemente neste mercado, uma vez que sua lógica de compensação permite prolongar a dependência da humanidade dos combustíveis fósseis.
O que vem nos sendo apresentado como solução pela crise climática é nada mais do que uma nova forma de acumulação de capital. A preservação de florestas em alguns lugares é apenas um efeito evanescente desta nova invenção do capitalismo tardio, e os benefícios para os povos da floresta uma promessa duvidosa.

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