Entre
o crepuscular do século XX e o alvorecer do século XXI, as lutas dos movimentos
indígenas se tornaram um importante instrumento político de transformação do
Estado excludente herdado do período colonial na América Latina. Elas têm na
defesa do território um elemento de reivindicação e resistência à opressão e à
exploração.
Na Amazônia Ocidental - região que
compreende o Acre, o sul do Amazonas e o noroeste de Rondônia -, o início da
colonização esteve diretamente ligado à exploração extrativista da borracha. Naquele
momento, a ação direta do Estado impulsionou a migração nordestina para a
Amazônia, estabelecendo com isso um
novo contexto social, econômico, cultural e territorial na região.
O confronto entre os que vinham de
outras partes do Brasil e os que habitavam a região foi inevitável e desigual.
Para responder aos modelos hegemônicos de ocupação capitalista baseados na
violência e espoliação, os povos indígenas estabeleceram diferentes movimentos
de resistências, que podem ser compreendidos tanto a partir das comunidades
quanto a partir de suas organizações representativas.
A economia extrativista de exploração da
borracha foi, para os indígenas, um tempo de perseguição e violência. Às vezes,
o Estado era o próprio sujeito da perseguição e da violência. Às vezes, eram os
vindos de fora, sendo o Estado omisso espectador. Através das chamadas
“correrias”, eles foram submetidos à dispersão, expulsos das margens para as
cabeceiras dos rios; à dizimação e à pacificação, transformação dos indígenas
em “mão de obra” para os seringais.
Através
dessas correrias, alcançou-se a “limpeza” das terras, tradicionalmente ocupadas
pelos nativos, para a exploração capitalista colonial. Já desde aquele momento, vê-se o Estado dispensar tratamento
hostil aos povos indígenas. A estes não restava outra coisa senão fugir mais
para dentro da mata ou reagir na defesa de suas terras. No mais das vezes,
porém, a reação se dava de forma desarticulada e ineficaz.
É, pois, no contexto de ação violenta do
Estado que os povos indígenas articulam a resistência contra a invasão e saque
das terras e dos bens naturais. Com isso, surgem novas formas de resistência,
inspiradas na organização formal e coletiva dos povos indígenas, diferentes das
organizações tradicionais de cada povo, ainda que, de certa forma, ligadas a
elas.
Novo tempo, nova forma
de organização e resistência
A década de 1970, no Acre, marca a
substituição do extrativismo pela pecuária extensiva de corte, que, ao lado da
grande propriedade fundiária, consistirá no eixo central da modernização. Por
outro lado, ela é também um marco no que diz respeito às formas de organização
e resistência por parte do movimento indígena. Às novas formas de opressão e
exploração corresponderam novas formas de resistir.
Até aquele momento, a resistência dos
povos originários na Amazônia Ocidental era determinada a partir de suas
comunidades. Naqueles idos anos, porém, os índios passaram a contar com o apoio
de um importante aliado: a Igreja Católica. Somava-se a isso a atuação do
Conselho Indigenista Missionário (CIMI), uma espécie de pastoral indigenista.
Este foi criado em 1972 pela Igreja
Católica, ainda com uma estrutura clerical e vertical, mas com novas
inspirações pastorais fundamentadas na Teologia da Libertação. Ao mesmo tempo
em que questionava o modelo de missão tradicional (baseado na evangelização com
vistas ao proselitismo e, portanto, no aculturamento), o “CIMI buscava novas
formas de compromisso com as comunidades indígenas” (SUESS, 1989: 19).
No que tange ainda à atuação da Igreja
Católica, vale ressaltar a importância das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)
e das Pastorais Sociais. Sua atuação foi demasiado importante para o
fortalecimento da luta dos movimentos dos trabalhadores rurais e dos indígenas
na região.
Sempre naquela década, surge também
outra importante aliada dos povos indígenas: a Comissão Pró-Índio (CPI) do
Acre. Trata-se de uma organização não-governamental, criada com o objetivo
específico de atuar com os povos indígenas. Hoje ela é parceira do Estado na
execução de projetos nas terras indígenas com caráter “ecodesenvolvimentista”.
Com
o surgimento de conflitos pela posse da terra, desde a região do vale do Juruá
até a região do vale do Purus, os indígenas, com o apoio das entidades
indigenistas, procuram tecer uma articulação, envolvendo cada vez mais
lideranças de diversos povos, como os Kaxinawá, os Apurinã, os Shanenawa. O
objetivo era unificar a luta através da realização de Assembleias indígenas. A
esse respeito Forneck lembra:
Assim
na semana do índio de 1981, na casa do CIMI, situado então à (sic) Rua Cel.
João Donato, reúnem-se lideranças Kaxinawa do rio Jordão, Humaitá, Envira e
Purus, Apurinã do Seruini, Km 45 e Camicuã; Shanenawa do rio Envira; Jarauara e
Paumari do baixo Purus. Essa Assembleia foi organizada pelo CIMI e CPI-AC que,
apesar da proibição por parte da FUNAI e da Polícia Federal, tiveram a coragem
de assumir o evento. O encontro não poderia ser em local público, sob pena de
prisão dos organizadores (FORNECK, 1997: 41).
Marcada
pelo surgimento de novos parceiros e estabelecimento de alianças, esta nova
realidade favoreceu uma “guerra de posição” no seio da “sociedade civil”. Aí,
os trabalhadores rurais, indígenas e aliados buscavam fazer frente aos “de
cima”, estes fortemente apoiados pelo Estado.
Assim, no início da década de 1980, pela
afirmação da identidade e pela defesa da terra, surge o movimento indígena
organizado da Amazônia Ocidental, constituindo o Núcleo de Cultura Indígena (NCI). Este era vinculado ao Centro Ecumênico de Documentação e
Informação (CEDI). Com isso, alcançava-se, pela primeira vez, a unificação
das lutas dos povos indígenas da região.
Ainda no curso dos anos 1980, o NCI
mudou o nome para União das Nações
Indígenas do Acre, sul do Amazonas e noroeste de Rondônia (UNI/AC). Era
indisfarçável seu caráter eminentemente
político. Ela contava com a participação das comunidades, o que proporcionava
legitimidade ao movimento. Porém, a preocupação com o processo institucional
era ainda bastante incipiente.
O movimento buscava o apoio da sociedade
brasileira e da comunidade internacional para suas reivindicações, tendo como
eixo central a recuperação e garantia de suas terras. Favorecia-se, dessa
forma, a unidade do movimento e sua vontade expressa de assumir o papel de
sujeito histórico. Era inelutável o confronto com o Estado.
Naquele contexto de resistência dos
movimentos sociais, surge também a oportunidade de lutar no campo da política partidária.
Partiram, então, para a disputa do poder político estatal. A estratégia era
bastante compreensível e até atraente, tendo em vista a abertura do regime
pós-ditatorial no Brasil.
No movimento indígena, a luta política
partidária foi intensificada visando a uma participação indígena atuante na
Constituinte de 1988. Na verdade, “as lideranças indígenas acreditavam no
fortalecimento da representação política como sendo indispensável para o êxito
das lutas” (DEPARIS, 2007: 107).
O movimento social acreano, agora
(década de 1990) somava-se à base política partidária cuja referência era o
Partido dos Trabalhadores (PT), que já ameaçava o monopólio das oligarquias
políticas naquela época. A relação do movimento com a base partidária se
estreita ainda mais em 1999, quando o governo do Estado passou a ser conduzido
pela FPA. Esse grupo político era composto por doze partidos (PT, PSDB, PC do
B, PMN, PL, PDT, PPS, PV, PTB, PT do B, PSB e PSL), tendo o engenheiro
florestal Jorge Viana (PT) e Edson Cadaxo (PSDB) como Governador e
Vice-Governador, respectivamente. Era uma coalizão atraente para o movimento
indígena, afinal era liderada pelo PT, aliado histórico dos “povos da
floresta”.
Crônica de uma vitória
às avessas
Tendo chegado ao poder estatal, a FPA
buscou apoio de agências governamentais e não governamentais, nacionais e
internacionais, e de bancos multilaterais de desenvolvimento para implementar o
Programa de Desenvolvimento Sustentável do Acre (PDSA). Segundo as autoridades governamentais do Acre,
o referido programa de desenvolvimento é inspirado no modo de vida dos “povos
da floresta”: seringueiros, camponeses, ribeirinhos e índios.
Nesse novo contexto, alguns membros dos
movimentos sociais são convidados a tomar parte na condução da máquina estatal. Como outras lideranças dos povos da
floresta, as lideranças indígenas celebraram a parceria e os acordos firmados
com o governo. Para eles, isso representava a oportunidade de modificar uma
realidade histórica de descaso e violência por parte do Estado.
Agora, o Estado se apresentava como
“amigo”. Pouco se deu atenção ao fato de o projeto da FPA ter à sua frente as
oligarquias locais e agências de cooperação técnica e financeira de países como
Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos.
Em
parceria com o movimento indígena, o governo da FPA inicia um processo de inserção
da temática indígena como política pública, incorporando demandas com o
objetivo de conciliar o projeto de desenvolvimento do Estado com a melhoria de
condições de vida nas comunidades indígenas. Nesse sentido, foi criado o
“Programa Emergencial de Desenvolvimento de Comunidades Indígenas”,
desenvolvido pela UNI/AC através de um convênio firmado com o governo do Acre.
Seguindo
a mesma lógica, vários fóruns institucionais foram criados para discutir as
questões que afetavam ou interessavam diretamente às populações indígenas:
educação escolar, saúde, produção, autossustentação etc.
Também
entrou em discussão a pavimentação das BRs 317 e 364, com a realização de
audiências públicas para discutir o componente indígena do EIA-RIMA destas
obras. Porém, parte desse estudo nunca veio a lume. Várias ações que foram
planejadas a partir dele não foram executadas em sua totalidade ou mesmo não
saíram do papel.
Organizando
o domínio estatal, desorganizando a resistência
No
intuito de organizar e articular seus projetos e também devido às
reivindicações do movimento indígena, o governo do Estado do Acre criou através
da Lei Complementar Nº 115, de 31 de dezembro de 2002, a Secretaria Extraordinária dos Povos Indígena (SEPI). Esta é
vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Humano e Inclusão Social. Tratava-se
não de uma secretaria executiva, mas de articulação, planejamento e
acompanhamento, algo distinto do que os indígenas reivindicavam.
Além
da SEPI, o governo criou em 19 de fevereiro de 2003, através da Lei Ordinária
Nº 1492, o Conselho Estadual Indígena
(CEI), com caráter consultivo e deliberativo, formado por representantes de
órgãos estaduais, órgãos federais e por organizações indígenas e indigenistas.
Juntamente com o CEI, foi criado também o Fundo
de Preservação e Desenvolvimento dos Povos Indígenas do Acre (FPDIAC). Os
recursos deste fundo seriam destinados a programas e projetos definidos como
prioritários para o referido Conselho.
A
lei que criou tanto o CEI e o FPDIAC deveria ser regulamentada até o dia 19 de
abril de 2003 – o que nunca aconteceu e a iniciativa nunca “saiu do papel”. Incompetência?
Impossibilidade? Cremos que não. Se tal sucedeu, foi algo “friamente
calculado”, para usar as palavras do grande herói mexicano.
A
criação da Secretaria e do Conselho dava a impressão de que estava surgindo um
cenário muito positivo para os povos indígenas. E, mais que a Secretaria, o
Conselho era fundamental para assessorar, elaborar, analisar, articular e
avaliar os diferentes programas voltados para os povos indígenas. Ele seria
formado com maioria indígena e teria representação de organizações indígenas
das diferentes regiões do Acre:
O
CEI é formado por representantes de quatro órgãos estaduais (Gabinete Civil,
SEE, SEPRO e SECTMA), três órgãos federais (FUNAI, FUNASA e UFAC), três
organizações indigenistas (CPI-Acre, CIMI e COMIN), dez organizações indígenas
(UNI, OPIRE, OPITAR, OPIRJ, APIWTXA, ASKARJ, AAPBI, OAEYRG, GMI e OPIAC) e
outros dois representantes de povos indígenas (um do rio Purus e outro do rio
Iaco): 22 membros e seus respectivos suplentes (AQUINO, 2006: 36).
Esperava-se
que o Conselho tivesse uma dinâmica que pudesse atender às expectativas dos
povos indígenas da região. Mas havia o perigo de essa instância fugir ao
controle e barrar ou prejudicar a execução dos projetos governamentais que,
como as estradas referidas acima, tivessem impactos sobre as terras e sobre o
modo de vida dos povos originários.
Neste
contexto, a SEPI teve um papel estratégico para as pretensões do Executivo
Estadual: articulando as ações compensatórias e mitigadoras nas diferentes Tis
do Acre, evitando resistência articulada por parte das comunidades e movimento
indígenas.
Não
resta dúvida de que, nas parcerias com o governo, o movimento indígena busca
protagonismo, como ao assumir as ações de saúde na região da Amazônia Ocidental
através do convênio UNI/FUNASA, nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas de
Saúde do Alto Purus e Juruá. Isso foi fruto de um convênio entre o governo de
Fernando Henrique Cardoso e o governo petista acreano. Porém, daí resultaram
consequências negativas, que culminaram na extinção da UNI/AC e no
fortalecimento da SEPI.
Ainda
através da SEPI, o governo investiu na estruturação das organizações de base
como Organização dos Povos Indígenas do
Rio Envira (OPIRE), Organização dos
Povos Indígenas de Tarauacá (OPITAR) e Organização
dos Povos Indígenas da Região do Juruá (OPIRJ)[3].
Com esse artifício, ele conseguiu assimilar lideranças à máquina estatal,
contratar assessores indígenas e deixá-los à disposição do Estado.
Dessa
forma, o que parecia contribuir para o fortalecimento do movimento contribuiu,
na verdade, para seu debilitamento. Organizações importantes na história de
resistência do movimento, como a UNI/AC, foram extintas. Experiências com
referências coletivas de organização foram pulverizadas. E assim a SEPI se
fortaleceu à medida que enfraqueceu o movimento indígena e suas organizações
representativas.
Por
essa razão, pode-se dizer que, com a criação da SEPI, foi estabelecido um novo
modelo de representação do movimento indígena: o governamental. O objetivo:
afetar as diferentes forças políticas do movimento, líderes e organizações,
cooptando-os ou isolando-os, tornando-os débeis, dependentes ou entusiastas do
governo.
Havia,
ao lado disso, a incorporação seletiva, a partir dos interesses do governo, das
demandas das comunidades indígenas no PDSA. Mas concessões, como a inserção de
parcelas dos indígenas na condução do aparato estatal, serviram muito mais para
dar aparência de legitimidade ao projeto. E afinal, que hegemonia pode ser
duradoura sem uma base material, ainda que parca? E mesmo o céu da mitologia
grega não precisava do titã Atlas para lhe suportar aos ombros?
“Gestão
territorial” e – indícios do – anacronismo da luta pela terra
Para
o mesmo sentido, contribuíram a disseminação de ideias como etnolevantamento, etnomapeamento, etnozoneamento,
etnodesenvolvimento e outros
neologismos congêneres. Essas ideias foram disseminadas no processo de
construção do Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE), através de iniciativas que
envolviam, além do governo, organizações nãogovernamentais ligadas à questão
indígena, como a CPI-AC. O ZEE foi fundamental para a institucionalização do
PDSA.
As
ações governamentais nas Tis, nas gestões de Jorge Viana (1999-2006) e de
Arnóbio Marques (ou simplesmente “Binho”, como também é conhecido) (2007-2010),
foram pautadas nesse tipo de estudos que visam à “gestão territorial”. Embora aleguem que possam trazer coisas
positivas para as comunidades indígenas, são instrumento de dominação por parte
do governo. Isto porque os dados coletados nas comunidades indígenas são
sistematizados com a cooperação técnica dos organismos internacionais, como
forma de justificar determinados projetos capitalistas que visam à exploração
da natureza. Trata-se, portanto, de uma forma de apropriação simbólica e
material dos territórios pertencentes aos povos originários.
O
diagnóstico etnoambiental configura-se como nova forma de dominação sobre os
povos indígenas e seus territórios. Nas palavras de Correia, esses
estudos/levantamentos
Mantêm,
portanto, um dos aspectos históricos da cartografia ocidental, mostrado por
Harley (1988), de serem utilizados para a dominação, mas, agora com novas
terminologias (mapeamento participativo, etnozoneamento, etnomapeamento, diagnóstico
etnoambiental, levantamento etnoecológico, levantamento etnoambiental etc.) e
associados à ideologia de desenvolvimento sustentável. Delineiam, assim, novas
formas de dominação sobre os povos indígenas (CORREIA, 2007: 187).
Através
desses expedientes, o governo elabora planos de “gestão” das potencialidades
econômicas das Tis. Sem acrescentar ou subtrair, esse é o caso do PROACRE.
Lançado no final de 2008, através de um novo contrato do governo do Acre com o
Banco Mundial (BM), esse programa objetiva à definição das ZAPs (Zonas de
Atendimento Prioritário) e das ZEDs (Zonas Especiais de Desenvolvimento).
Mas,
não casualmente, o referido programa pretende também promover o “ordenamento ou
adequação para o desenvolvimento sustentável, especialmente dentro de Unidades
de Conservação, Tis e projetos de assentamento”. Além de aprofundar a
subordinação do Estado às instituições financeiras internacionais, tal programa
permitirá o manejo madeireiro em áreas indígenas.
A
desarticulação do movimento na Amazônia Ocidental, dentre outras coisas,
resultou também na paralisação do processo demarcatório de TIs. São 17 a serem
demarcadas em todo o estado. Não foi por acaso que, historicamente, a
demarcação de terras se transformou na principal bandeira de luta e
reivindicação indígenas. Para os povos originários, a “posse” da terra
representa uma vitória palpável e um palpável instrumento de proteção contra
“os invasores”. Todavia, mantido o PROACRE, voltar à luta pela demarcação de terras
não será grande vantagem – ou mesmo vantagem nenhuma – para os índios.
Sejamos
claros. O “ordenamento ou adequação para o desenvolvimento sustentável”
significa: território indígena aberto ao capital e ao “invasor”. Desse modo, a
demarcação de terras não será, sequer formalmente, obstáculo ao capital. Nem
garantirá que os povos nativos perpetuem sua cultura, sua história e seu modo
de vida.
Assim,
poderiam os latifundiários, seus porta-vozes e ideólogos – que vivem a
protestar que “há muita terra pra pouco índio” – opor-se a que se demarquem as
terras indígenas? Por isso, a manter-se o atual quadro, a luta pela terra
tornar-se-á anacrônica, obsoleta.
“Transformismo”;
“propaganda de afirmação” e “prática de negação”
No
intuito de lograr êxito em seus propósitos, o governo vem envolvendo os
indígenas através do que o BM chama de “empoderamento”, o que, em tese, implica
inclusão participativa. Ao lado disso, o governo promoveu uma valorização
desses povos nunca vista na sociedade acreana, trabalhando positivamente para a
afirmação de sua identidade.
Com
efeito, aquilo que Paula diz a respeito dos seringueiros vale para os “povos da
floresta”, em geral, e para os índios, em particular: os seringueiros, que em
décadas anteriores foram considerados “atrasados”, agora[4]
passam a ser “modernos”, porque sua forma de se relacionar “com o meio natural
é a mais adequada para se garantir a proteção da floresta amazônica” (PAULA,
2005: 288).
Mas
o que significam, de fato, a participação/inclusão e a valorização dos
indígenas no Governo da FPA? A quem servem?
É
possível apreender o significado dessa participação/inclusão a partir do
conceito de “transformismo”[5].
Forjado por Antônio Gramsci, este conceito diz
respeito ao processo através do qual o Estado, via cooptação, assimila
personalidades políticas singulares e/ou grupos adversários inteiros. Estes
são, então, incorporados às forças conservadoras.
Através de tal expediente, o Estado
inclui-domestica àqueles que lhe faziam resistência e lhe criavam embaraços.
Exatamente como ocorre no Acre, onde o governo assimilou parte significativa
das lideranças e de setores indígenas, fazendo-os dóceis a seus interesses e
colaboradores seus. Dessa forma, os projetos estatais são apresentados como
sendo frutos de uma parceria entre iguais, harmônica, benéfica, eficaz. Quando
não, são apresentados como fruto de iniciativa dos próprios índios.
Os cooptados passam, então, a combater seus
grupos de origem. Procuram, também, fazer com que os relutantes e os avulsos
acatem os desígnios estatais[6].
Em razão disso, outro resultado inelutável de tal
processo é que o Estado se fortalece alimentando a fraqueza do movimento
indígena, tal como a SEPI submetendo ou extirpando as outras formas de
organização do movimento.
Não
são poucos os que percebem os perigos contidos nas políticas estatais, e
protestam contra isso – conquanto de forma ainda débil e inorgânica. Os que
assim agem são tratados com a exclusão, a desqualificação e a perseguição. A
retaliação estatal chega a atingir povos inteiros.
Em
verdade, quanto mais colaborador do governo mais chance tem um grupo de receber
melhorias em sua aldeia, e vice-versa. Em umas aldeias há até computadores. Em
outras (na maioria), porém, nem sequer as condições mínimas de saneamento,
saúde e educação são asseguradas.
Por
sua vez, a afirmação identitária dos povos indígenas pode ser compreendida sob
a mesma lógica da valorização dos “povos da floresta” em geral, onde também
encontra lugar a ressignificação dos heróis e da história acreana.
Recorrendo
ostensivamente a expedientes ideológicos[7],
o governo conta uma história acreana repleta de heróis e feitos. Segundo essa
narrativa, ela começa com a “Revolução Acreana” e é coroada com a vitória
eleitoral da FPA (1999) e com a implantação do “desenvolvimento sustentável” e da
“florestania”. Qualquer coisa que fuja a esse roteiro é apresentada como um
perigo, um retrocesso.
Nessa
empresa, as personalidades maiores[8]
da FPA se colocam como herdeiros únicos dos heróis daquela história/estória.
Daí abusarem, até à distorção, de figuras como Chico Mendes. Remodelam os
traços dessas “figuras gloriosas” até que, desfigurando-as, fiquem parecidas
com elas. Agigantam-nas, apenas para se gloriarem à sua sombra.
Por
isso, toda glorificação de Chico Mendes e de outras figuras graúdas da historia
acreana (como Galvez e Plácido de Castro) é, assim, uma glorificação daquelas
personalidades e das políticas estatais. Trata-se não de um culto aos mortos,
como em princípio poderíamos supor. Trata-se, isto sim, de um culto aos vivos.
Narcisismo elevado à máxima potência. Os sacerdotes incensam apenas a si
mesmos.
E
quanto à valorização dos povos indígenas? Não mais que apropriação
propagandística. Estes, como os povos da floresta em geral, são valorizados
apenas para difundir (interna e externamente) a ideia de que o governo, como eles e com eles, vive em harmonia com a natureza. Num momento em que os
povos da floresta são considerados portadores de um modo de vida sinônimo de
preservação ambiental, convém ao governo e a suas figuras de proa serem
identificados com eles, usurpando daí o prestígio que for possível.
Dessa
maneira, apresentar as políticas estatais como sendo inspiradas no modo de vida
dos povos originários contribui favoravelmente para o governo em pelo menos
dois sentidos: 1) funciona como uma espécie de legitimação das políticas
estatais, como a dar a elas o selo de ambientalmente benéficas; e 2) oculta que
a verdadeira matriz de tais políticas são os cânones do BM e do BID,
instituições, sabidamente, responsáveis por assegurar os interesses do capital
e dos países centrais (com destaque para os EUA) nos mais diversos rincões do
planeta.
A
contradição de tudo isso se torna manifesta no fato de haver agentes do governo
ensinando os índios a fazerem artesanato, a cuidarem da floresta através do
manejo, o que é crédito de carbono e outras coisas que são a mais completa e
perversa subversão de suas ancestrais tradições. Poderia haver contradição mais
gritante entre a propaganda de afirmação e a prática de negação da questão
indígena por parte do governo?
O
que ocorre no Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD) – a começar pela sua
criação em área reconhecidamente habitada pelos Nukini – é exemplar a esse
respeito. Camely traz o relato de um índio Nukini que muito ilumina a situação
dos nativos com a criação do Parque:
(...) ocorre que quando foi criado o Parque os Nukini já estavam aqui.
Alguns Nukini construíram aqui no Parque uma sede, tinha até uma escola. Era
uma organização boa. O Paulo era o cacique na época e aí acusaram ele de traficante,
tudo para justificar o que eles iam fazer: veio aqui a Polícia Federal e o
IBAMA, chegaram de helicóptero e tocaram fogo na sede, só deu tempo do pessoal
sair correndo. Tocaram fogo na moradia dos índios e da sede que funcionava como
uma escola. Também queimaram o posto de saúde. A Polícia Federal jogou gasolina
e tocou fogo. São 25 famílias Nukini que aqui nasceram e se criaram. Há uma
reivindicação nossa de que aqui seja regularizada a nossa terra, porque não
existe lugar igual a este. O que ocorre é que agora não se pode mais plantar,
não se pode fazer o que fazia antes. Nós nem sabia que isto aqui era Parque, há
pouco tempo foi que colocaram esta placa aí de Parque Nacional (CAMELY, 2009).
As
palavras do indígena acima mostram que a política ambiental do governo, longe
de ser inspirada e contribuir para a preservação do modo de vida dos povos
originários, é, em um sentido bem material, sua mais completa negação. Diante
de tamanha violência, compreende-se o quanto interessa ao governo lideranças
cooptadas e um movimento indígena desmobilizado.
Perspectivas
para os próximos anos
Para
lidar com os índios, Jorge Viana criou uma Secretaria (SEPI). Ao assumir o
governo, Binho fez da secretaria uma espécie de assessoria ou algo igualmente
precário e vago: Articulação Especial
dos Povos Indígenas. O primeiro valorizou mais a questão indígena que o
segundo? Não. Apenas, uma vez controladas as coisas e os sujeitos, o status de secretaria tornou-se
dispensável.
Tião
Viana segue linha semelhante à de Binho. Em suas mãos, a articulação virou Assessoria dos Assuntos Indígenas. Sua
eleição representa grande ameaça para os povos originários por, pelo menos,
dois motivos umbilicalmente ligados entre si: 1) sua obsessão pela exploração
de petróleo; 2) o declínio da legitimidade da FPA.
Tião
Viana é o principal defensor da exploração de petróleo e gás natural no estado.
Como senador, via emendas parlamentares, ele destinou nada menos que 75 milhões
para que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) levasse a cabo estudos sobre a
existência de gás natural e petróleo em solo acreano.
A
área em que se pretende realizar a exploração é fronteiriça. Ali, sabidamente,
serão impactadas áreas indígenas, inclusive de índios isolados. Devido aos
impactos que a exploração traz consigo, desde o início ela recebeu resistência
por parte de alguns grupos indígenas, seringueiros, pequenos produtores,
trabalhadores rurais etc. Não casualmente, tanto os estudos quanto seus
resultados são ocultados da sociedade.
No campo da resistência, merece destaque a
corajosa e intransigente atuação do CIMI. Por sua força de articulação e
autonomia diante do poder estatal, trata-se, hoje, da mais importante
organização indigenista atuante na Amazônia Ocidental. Sua aguerrida oposição
ao projeto da exploração obrigou Tião Viana, então senador, a apelar para a
hierarquia católica. O objetivo do parlamentar era evitar que esses “criadores
de caso” “atrapalhassem seu governo”.
A
apelação não surtiu o efeito esperado. As autoridades a quem recorreu apoiaram
a luta do CIMI em favor dos povos originários ou permitiram que ele a levasse a
cabo. Lamentavelmente, nem todas as autoridades católicas pensam em uníssono. E
a atuação do CIMI passou a ser minada por dentro da própria Igreja local. Pesa
neste sentido a falta de apoio ou mesmo a oposição do Bispo Dom Joaquín Pertíñez.
Inegavelmente
zeloso das questões mais litúrgicas e intraeclesiais, Dom Joaquín é
politicamente conservador, dispensa pouca atenção às questões sociais e ignora
– talvez por completo – a questão indígena. Sem o fundamental apoio dessa
autoridade, o CIMI fica praticamente isolado.
Decerto,
não se pode dizer que o Bispo apoia ativamente o governo. Mas seu
conservadorismo e ignorância criam embaraços para o CIMI. Como se pouco isso
fosse, alguns de seus assessores mais próximos são, confessadamente,
governistas. Entre outros, esse é o caso do Pe. Mássimo Lombardi.
Dentre
outras coisas, o referido clérigo atua como Coordenador das Pastorais Sociais,
cargo que exerce sempre condicionado pelo seu incondicionado apoio ao PT e à
FPA. Enquanto o CIMI evita participar de eventos e encontros promovidos pelo
Governo – para não legitimar projetos que são do interesse do governo e não dos
indígenas -, Pe. Mássimo não se faz de rogado. E ainda posa para foto. Com esse
simples ato, além de seu apoio pessoal, o sacerdote hipoteca o apoio da Igreja
e das pastorais sociais a que representa, entre as quais o CIMI[9].
Durante
as campanhas eleitorais, Tião Viana afirmava que se abria uma nova fase de
desenvolvimento para o Acre: o da indústria. Eis aí o que pode lhe servir de
justificação ideológica para promover exploração de petróleo, ainda que ao
preço de deixar mais expostas as insuficiências e contradições do
“desenvolvimento sustentável” que defende.
Tão
perceptíveis quanto as insuficiências são as contradições. Alega-se preservação
ambiental, mas mercadifica-se a floresta, entregando parte significativa dela
às serrarias! Propõem-se a plantação de cana-de-açúcar para a produção de
bicombustível, e busca-se, obcecadamente, exploração de petróleo. É possível
conceber esquizofrenia mais extremada?
Dizem
que o sustentável surge, historicamente, para qualificar aquele tipo de
desenvolvimento que se põe na contramão do desenvolvimento que se consolida com
a Revolução Industrial, este calcado na exploração irracional dos recursos
naturais e na utilização de combustíveis fósseis. Mas no Acre não há diferença
entre um e outro. Vê-se que o projeto de desenvolvimento em curso se assemelha
à caixa de Pandora. Muitos são os males que dela têm saído. Mas não a
esperança.
O declínio da legitimidade da FPA e a
“nova etapa do desenvolvimento” do estado apontam-nos para o recrudescimento da
situação. Tudo leva a crer que os anos vindouros serão difíceis. E, para o
melhor como para o pior, propícios para recompor a resistência. Ou, nas
palavras de Mao Tsé-Tung: “Existe um grande caos abaixo do céu – a situação é
excelente”.
Considerações
Finais
Historicamente,
a relação Estado-Movimento Indígena na Amazônia Ocidental foi marcada pelo
conflito. O Estado sempre dispensou ao Movimento Indígena exclusão, indiferença,
violência etc. A luta dos povos originários por autodeterminação e defesa da
identidade e do território sempre encontrou nele impiedoso adversário.
Entretanto,
em 1999, com a eleição do governo da FPA, cria-se grande expectativa de
mudanças positivas nesse histórico. O Estado seria conduzido por um partido que
mantinha relações amistosas com o movimento indígena. É criada a SEPI e também
espaços e instâncias em que os nativos poderiam se fazer ouvir.
Pela
primeira vez, os indígenas foram encarados como sujeitos e convidados a tomar
parte na condução do aparato estatal. Além disso, o referido governo colocou em
marcha um modelo de desenvolvimento que dizia ser inspirado no modo de vida dos
“povos da floresta”.
Paralelamente,
porém, o governo promoveu um intenso processo de cooptação de lideranças
indígenas e de desmobilização do movimento. Em função disso, hoje não há mais
reivindicação ardorosa e combativa por demarcação de terras. Pouco se protesta
contra a conclusão das BRs 364 e 317 e contra a criação de áreas de preservação
ambiental que, sabidamente, afetam irreversível e perversamente alguns povos.
Por
outro lado, o governo tem promovido estudos e mais estudos sobre a
potencialidade econômica das TIs, certamente intentando explorações. E, mais recentemente,
ele tem criado as condições para implantar o manejo madeireiro também em TIs.
Por
força de tais razões, pode-se dizer que convidar o movimento indígena a tomar
parte na estrutura estatal foi uma forma que o governo encontrou de vigiá-lo,
desmobilizá-lo, enquadrá-lo.
O
pior desses tempos sombrios, entretanto, é que, ainda entre muitos, essa contrarrevolução
é celebrada como revolução.
Referências
Bibliográficas
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Fabio de Andrade. Governança Global sobre Florestas: O caso do Programa
Piloto para Proteção das Florestas Tropicais do Brasil – PPG7 (1992-2006),
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Nazira Correia. A geopolítica do
ambientalismo ongueiro na Amazônia
brasileira: um estudo sobre o caso do Acre. Tese de doutorado. Universidade
Federal Fluminense, 2009.
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Clode de Souza. Etnozoneamento,
Etnomapeamento e Diagnostico Etnoambiental: Representações Cartográficas e
Gestão Territorial em Terras Indígenas no Estado do Acre. Universidade de
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Indígenas (UNI): Contribuição ao Movimento Indígena no Brasil (1980-1988).
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Indígena: da resistência à subordinação. Monografia. União Educacional do
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Acre e sul do Amazonas. [trabalho de conclusão de curso] Rio Branco:
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PAULA, Elder Andrade de. (Des)Envolvimento insustentável na Amazônia
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EDUFAC. (Séries Dissertações e Teses – 7). Rio Branco, 2005.
SOBRINHO,
Pedro Vicente. Capital e trabalho na
Amazônia Ocidental. São Paulo: Cortez Editora; Rio Branco (AC): Universidade
Federal do Acre, 1992.
SOUZA, Israel Pereira Dias de. “Reformas do Estado” e Discurso
Florestânico no Governo da Frente Popular: entre a epopeia e a tragédia.
Rio Branco: UFAC, 2005 (Monografia de Graduação em Ciências Sociais).
SOUZA,
Israel Pereira Dias de. Ambientalismo e
geopolítica na Amazônia-Acreana: da criação das RESEX aos corredores da
espoliação. Texto apresentado no XIV Congresso Brasileiro de Sociologia no
Rio de Janeiro, 2009.
SUESS, Paulo. A Causa Indígena na Caminhada e a Proposta
do Cimi: 1972-1989. Petrópolis: Vozes, 1989.
[1] Trata-se de uma
versão, um tanto modificada, do trabalho Estado e Movimento Indígena na
Amazônia Ocidental: do conflito à conciliação?, apresentado no II Encontro da
Sociedade Brasileira de Sociologia da Região Norte, realizado entre os dias 13
e 15 de setembro de 2010, Belém (PA). Esse texto faz parte de meu livro Democracia no Acre: notícias de uma ausência, lançado agora em 2014.
[2] Graduado em Ciência
Política e Mestre em Desenvolvimento Regional
pela Universidade Federal do Acre-UFAC/Brasil, membro do Núcleo de Pesquisa
Estado, Sociedade e Desenvolvimento na Amazônia Ocidental (NUPESDAO). E-mail: israelpolitica@gmail.com
[2] Professor e Pesquisador do Centro de
Filosofia e Ciências Humanas da
Universidade Federal do Acre-UFAC/ Brasil.
E-mail: elderpaula@uol.com.br
[3] A esse respeito a OPIRJ é emblemática. Sua
sede, manutenção e pagamento de funcionários são bancados pelo Governo. Que
autonomia é possível em tal situação? A organização é do movimento indígena ou
do Estado?
[4] Paula se refere ao período em que a
preocupação com a preservação ambiental ganha relevo e os modelos de
“modernização” passam a sofrer resistência por amplos setores da sociedade. É
sem prejuízo para suas referências, porém, que lançamos mão de sua observação
para analisar o que ocorre no Governo da FPA.
[5] Pelo que sabemos, Paula (2005: 291) foi o
primeiro a usar o conceito de transformismo para analisar a capitulação
ocorrida no seio das organizações das classes subalternas depois da ascensão do
PT ao governo do estado. O que ele fez enfocando o Movimento dos Sindicatos dos
Trabalhadores Rurais (MSTR), fazemos enfocando (num trabalho de menor fôlego,
claro) o movimento indígena.
[6] Em mais de uma ocasião, presenciamos os
índios ligados ao governo chegarem a encontros promovidos pelo CIMI levando
“recados” do governo, insinuando que o encontro era sem sentido, que, sem
precisar daquilo, o governo atenderia às reivindicações. Às vezes, eles
simplesmente travavam o encontro pela via do tumulto.
[7] Para melhor entender as estratégias
consensuais das quais o governo lança mão, recomendamos Souza (2005). Aí o leitor
encontrará uma análise mais ampla e detalhada sobre o tema. Nesse trabalho,
encontra-se a formulação do conceito de discurso florestânico (o conjunto de
ideias em torno e através das quais o governo da Frente Popular elabora o
consenso – e o “desenvolvimento sustentável” está entre elas – e que se
materializam e massificam através dos aparelhos de hegemonia da sociedade
civil: meios de comunicação, sindicatos, ONGs, igrejas, etc. As obras e todas
as práticas que despertam e estimulam o civismo (como cantar o hino acreano nos
eventos promovidos pelo governo) acabam também por tomar parte nesse discurso),
ainda hoje pertinente para analisar as estratégias ideológicas de dominação da
FPA. Além disso, são tratadas também a ressignificação da história e dos
heróis, ao lado de uma abordagem crítica e sistemática acerca do termo
florestania etc.
[8] Jorge Viana e Tião Viana.
[9] Em face dos
problemas no estado e da magnitude dos desafios, hoje o CIMI atua no sentido de
conseguir aliados em toda a Amazônia brasileira e, ainda, na Amazônia boliviana
e na peruana. É nesse sentido que se pode entender o Seminário Internacional Grandes Projetos na Amazônia e seus Impactos,
ocorrido em Rio Branco-AC entre os dias 2 e 4/06/2010. Entendemos que essa,
mais que uma atitude acertada, é uma atitude necessária. É inconcebível
restringir às esferas local, regional e – ou no máximo – nacional, enquanto há
muito o capital atua numa escala continental.
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