VientoSUR - [Plataforma BNDES, Tradução de Diário Liberdade] Como qualquer “império”, o Brasil atenta contra a soberania da Bolívia.
No dia 25 de agosto, as organizações da Plataforma BNDES e suas correspondentes, tanto no Brasil como nos países da América Latina, apresentou ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) uma carta, dirigida ao presidente da instituição, Luciano Coutinho, que exige a suspensão do financiamento imediato para o projeto de construção de estradas que tem como objetivo conectar as cidades de Villa Tunari e San Ignacio de Moxos, cortando através do Território Indígena e o Parque Nacional Isiboro Sécure (TIPNIS) na Bolívia. Com 306 quilômetros, esta estrada está estimada em 415 milhões de dólares, dos quais 332 milhões (80%) são financiados pelo BNDES.
Na carta, as organizações disseram que “... estes fundos, outorgados em virtude do contrato de Cooperação Financeira entre o BNDES e o Governo da Bolívia, viola os direitos de muitos e minava a convivência harmônica entre os povos do Brasil e da Bolívia”. Também se estabelece que as obras no TIPNIS violam a Constituição do Estado boliviano, a Lei boliviana de Meio Ambiente e o Regulamento de Áreas Protegidas, bem como as convenções internacionais como a OIT 169".
Apesar de gastar milhões em publicidade para criar uma imagem de banco moderno, transparente e preocupado com questões sociais e ambientais, o BNDES nem sequer deu uma resposta a esta demanda justa, baseada no fato básico de que os bolivianos claramente não querem que se leve a cabo este trabalho.
Então a pergunta é, uma vez mais: Sobre quais critérios sociais e ambientais que o Banco decide financiar um projeto na Bolívia? Tem o mesmo rigor que aplica nos projetos no Brasil?
Exatamente um mês depois da entrega da carta ao BNDES, no domingo (25/9) iniciou-se uma brutal operação policial contra cerca de 800 manifestantes, a maioria de povos indígenas, incluindo crianças e mulheres, membros de uma marcha pacífica em defesa do TIPNIS.
Foram utilizados gases lacrimogêneos e golpes de cassetetes. Houve uma dispersão forçada, jogaram fogo no acampamento e as mães e as crianças foram separadas de maneira indiscriminada em oito ônibus rumo a Yucumo. De acordo com o informe do Fórum Boliviano sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Fobomade), há uma lista preliminar de dezenas de pessoas desaparecidas, incluindo crianças.
As manifestações que seguiram à dispersão violenta da VIII marcha indígena em várias cidades da Bolívia, seguido pela renúncia da ministra de Defesa, Chacón Cecilia, e as repercussões terríveis em todo o mundo, fez com que o presidente Evo Morales anunciasse a suspensão das obras na noite do dia 26. E até agora, a sociedade civil brasileira e boliviana ficam sem uma resposta do BNDES.
O BNDES tem a obrigação de investigar as graves denúncias de que o superfaturamento dos contratos firmados entre a Agência Boliviana de Estradas (ABC na sigla em espanhol) e a empresa brasileira OAS, para a construção desta controvertida estrada; denúncias, que foram apresentadas pelas organizações bolivianas ao Ministério Público desse país no último dia 27 de setembro. Há evidências de que, neste trabalho, o custo do quilômetro é de 1.3 milhões de dólares, enquanto o preço médio de outras estradas na Bolívia é de 500 mil dólares, o que indicaria um superfaturamento de 800 mil dólares cobrados pela empresa brasileira por cada quilômetro.
Portanto, uma vez mais insistimos na urgência da adoção por parte do Banco, de uma política de informação pública para facilitar o acesso às populações afetadas, os dados sobre os projetos, incluindo ao exterior.
O governo brasileiro, por sua vez, perdeu uma grande oportunidade para apoiar a luta legítima dos indígenas bolivianos. Em troca, deixou escapar uma nota vergonhosa que confirma sua “vontade de cooperar com a Bolívia no contexto do trabalho”, visto como “um projeto de grande importância para a integração nacional da Bolívia, que cumpre com os parâmetros relacionados com o impacto social e ambiental da legislação boliviana”.
E aqui outra pergunta: Se o povo boliviano não quer a estrada por todas as razões expressadas, com que direito o governo do Brasil apoia a construção da estrada a favor da integração e do desenvolvimento da Bolívia?
Ao se posicionar desta maneira, ignora a dor causada pela desaparição de dezenas de pessoas, todos os levantamentos, greves de fome e manifestações que se produzem neste momento na Bolívia como consequência da violenta repressão de seu governo. Isto não afetaria a soberania do povo boliviano?
Ainda que praticamente não tenha sido divulgado no Brasil, os manifestantes realizaram uma manifestação em frente à embaixada em Laz Paz, no mês de agosto. Gritando palavras de ordem contra a estrada e acusando a postura do Brasil como “imperialista”.
Apesar das petições de contatar com o Ministro Chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e com o representante do BNDES, estas nunca se realizaram. Portanto, rechaçamos a atitude do BNDES e do Ministério de Relações Exteriores de fazer caso omisso das verdadeiras aspirações da população boliviana, colocando os interesses econômicos das corporações e os lucros acima do respeito à vida, à biodiversidade, o direito dos povos indígenas nesse país e a soberania do povo boliviano.
Também estamos repudiando o fato de que no dia 29 de agosto, por convite do edifício da OAS (empresa responsável pela execução da estrada), o ex-presidente Lula tenha ido à Bolívia para interceder junto com Evo Morales e facilitar a execução deste projeto.
Reafirmando que o BNDES é corresponsável das violações pelos projetos que financia, exigimos que o banco público brasileiro detenha imediatamente a financiação deste projeto de estradas na Bolívia. Também exigimos que o Ministério de Relações Exteriores se retrate publicamente e reconheça a importância da luta do povo boliviano em defesa da vida e o respeito aos seus direitos constitucionais adquiridos.
Assinam esta carta:
Brasil
Plataforma BNDES, Alternativas para Pequena Agricultura no Tocantins (Apa - TO), Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Assembléia Nacional de Estudantes - Livre (ANEL), Associação Agroecológica Tijupá de São Luis/MA, Associação Brasileira de Agroecológia, Associação Paraense de Apoio às Comunidades Carentes (Apacc), ATTAC - Brasil, Comissão Pastoral da Terra, Comitê Dorothy, Comitê Metropolitano do Movimento XIngu Vivo para Sempre, Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), EcoHomem - Grupo de Ecologia Humana de Estudantes da Universidade Federal da Integração Latino Americana, Escola de Formação Política e Cidadania do Ceará, Esplar - Centro de Pesquisa e Assessoria, Fase - Programa Amazônia, Fase – Solidariedade e Educação, Fórum da Amazônia Oriental (Faor), Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad), Fórum Permanente de Cidadania de Colinas, Maranhão, Fórum Social Pan Amazônico (FSPA), Instituto Amazônia Solidária e Sustentável (Iamas), Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Instituto Brasileiro de Inovações pró-Sociedade Saudável Centro Oeste, Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Instituto Madeira Vivo, Instituto Mais Democracia, Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs), Instituto Universidade Popular (Unipop), Justiça Global, Justiça nos Trilhos, Movimento Ibiapabano de Mulheres, Ceará, Movimento Xingu Vivo para Sempre, Núcleo Amigos da Terra Brasil, Rede Alerta contra o Deserto Verde, Rede Brasil Sobre Instituições Financeiras Multilaterais, Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA), Rede Jubileu Sul Brasil, Repórter Brasil, Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Federal no Estado do Pará – Sintsep/PA.
Internacionais:
Alianza Internacional de habitantes, Alianza Mexicana por la Autodeterminación de los Pueblos (Amap), ATTAC - Argentina, Comitê para a Anulação da Dívida do Terceiro Mundo (Cadtm), Centro de Estudios Aplicados a los Derechos Económicos, Sociales y Culturales, (Ceadesc) - Bolivia, Comité Pro Niñez Dominico Haitiana, Diálogo 2000 – Argentina, Foro Boliviano sobre Medio Ambiente y Desarrollo (Fobomade), Forum Solidaridad Perú, Grito de las/os Excluidas/os- capítulo de Puerto Rico, Grupo de estudios sobre America Latina y el Caribe – Geal, International Rivers, Jubileo Sur/Américas. Movimiento Ciudadano frente al Cambio Climático - Mocicc, Perú, Movimiento de Documentalistas – Argentina, Movimiento Social Nicaraguense Otro Mundo es Posible, Mujeres Solidarias y Amorosas (Musas) – Porto Rico, Oilwatch Sudamerica, Proyecto Caribeño de Justicia y Paz – Puerto Rico, Red Mexicana de Acción frente al Libre Comercio (RMALC), Red Mexicana de Afectados por la Mineria (Rema), Rede Jubileu Sul Global, Sociedad de Arqueología de La Paz – Bolívia, Unidad Ecologica Salvadoreña -Unes, Xarxa de l‘Observatori del Deute en la Globalització (ODG), Estado español.
Difundido por Correspondencia de Prensa germain5@chasque.net
Fonte: Diário Liberdade
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