Por certo, o último
pronunciamento da presidente Dilma em cadeia nacional (08/03/15) fez com que,
pela primeira vez, muitos membros da “elite branca” procurassem o caminho da
cozinha e tomassem panelas nas mãos por motivos não culinários.
Como sempre, a grande imprensa
noticiou o ocorrido de modo hiperbólico, dando exagerada ênfase ao caráter “popular”
da manifestação. Do lado governista, também de um modo exagerado, disseram que
o tal “panelaço fracassou”, que a manifestação ficou circunscrita a regiões em
que o governo perdeu as últimas eleições, a áreas sabidamente elitistas e etc.
Como
um pouco atenção, é possível perceber que governistas e oposicionistas fazem análises
antípodas e hiperbólicas. Por interesses mais que óbvios, estes superestimam os
protestos; e aqueles, subestimam.
A falar a verdade, não
pertenço à “elite branca”. Não bati panelas, e, no entanto, não engoli o
pronunciamento da presidente. O discurso era bem aprumado. Todavia, divorciado
da realidade. Para ser mais exato, pareceu-me demagógico.
Vale
lembrar que, quando a crise atingia fortemente a Europa e os EUA como uma
grande onda, Lula dizia que aqui a crise mais parecia uma “marolinha”. Naquele
momento, as atuais forças governistas, colocando-se como exemplo para o mundo,
rechaçavam os ajustes fiscais em curso naqueles países. Disseram mesmo em tom
ufanista que “o Brasil foi o último país a entrar na crise e o primeiro a sair
dela”.
E
agora, que nossa economia anda cambaleante, culpam a crise internacional e põem
em marcha o ajuste fiscal que rechaçavam nos outros países. E o fazem
exatamente neste momento em que alguns governos da Europa, corajosa e
inteligentemente, resolveram abandonar o receituário neoliberal como cura para
a crise.
Não
me engano com as hipérboles da oposição. As manifestações contra o
pronunciamento de Dilma não foram tão populares quanto querem que creiamos. Não
vi imagens nem noticias de panelaços nas favelas e periferias. E, se houve
manifestações nesse sentido, não chamaram tanto a atenção.
Também não me convencem as
hipérboles governistas. As manifestações não foram tão elitistas quanto querem
que creiamos. Consideremos, por um lado, o fato de que a turma do capital
financeiro não tomou e, permanecendo as coisas como estão, nem tomará o caminho
da cozinha para protestar contra o atual governo.
Essa turma está contente com
o Brasil, que, nos dizeres de Leda Paulani, virou uma “plataforma de valorização
do capital financeiro” (ver seu livro Brasil
Delivery). Lula traduziu isso em linguagem mais simples ao dizer que “nunca,
na história desse país, os banqueiros ganharam tanto”.
O capital financeiro regozija-se
com os altos juros de Dilma, Levy e Tombini. Satisfeito, o filho não bate pé ou
panela contra a mãe, nem mesmo faz beicinho.
Por outro lado, consideremos
que o panelaço de ontem não foi tão elitista quanto os governistas pretendem
porque as medidas do governo atingiram negativamente direitos trabalhistas e
sociais. Algumas medidas da presidente parecem mostrar que ela quer fazer da
cúpula de nossa sociedade a sua base. Isso impacta a popularidade de Dilma que,
em queda, é um claro sinal de que a insatisfação com ela e seu governo não se
restringe à “elite branca”.
Se quiser ter mais solidez,
o governo tem que abandonar de vez o mantra “a elite branca”, que hoje não
explica muito e convence muito pouco. Além de ter dado mais munição às forças oposicionistas, o pronunciamento da presidente deixou muitos setores populares
apreensivos. Destaco uma frase sua: “o atual processo (de ajuste) continuará o
tempo que for necessário para alcançar o reequilíbrio de nossa economia”.
Ainda não vejo motivos para
ir às panelas. Mas aquelas palavras me fizeram pensar que, talvez, a vaca
continue tossindo... Sendo assim, as massas serão forçadas a saírem às ruas com
panelas... e quererão da presidente não menos que o fígado... Assim sendo,
estarei lá, com uma caçarola na mão...
[1]
Cientista Social com
habilitação em Ciência Política, mestre em Desenvolvimento Regional e membro do
Núcleo de Pesquisa Estado, Sociedade e
Desenvolvimento na Amazônia Ocidental - NUPESDAO. E-mail:
israelpolitica@gmail.com
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